Que o ano passado foi desastroso em matéria de água e recursos hídricos no período de Verão, todos sabemos. Que isto influencia muita coisa, desde o vital abastecimento às populações e indústria até ao combate aos incêndios, também é conhecido. O que muita gente ainda não notou é a clara e perigosa tendência para o facilitismo.
Nisto, Portugal embaraça mais uma vez quem o vê atentamente, seja de fora ou mesmo de cá dentro. Fomos capazes de, mais uma vez, pôr em evidência um dos maiores defeitos que poderemos ter: o fazer apenas quando o mal aparece; o reagir em vez de agir. Não é uma atitude exclusivamente nossa, mas seria bom não a demonstrarmos tanto. Tem sido com base nisso que o assunto da água volta, literalmente, à superfície.
Mesmo tendo a experiência dos últimos 5 anos, mesmo conscientes dos perigos, mesmo avisados pelos especialistas, mesmo estando à beira do colapso iminente e irreversível no caso de fracasso, continua a ser prática na sociedade portuguesa o tal facilitismo em matéria de recursos hídricos. Até agora, nos "Verões" preocupantes (antecedidos de poucas chuvas), mandam todos apertar o consumo ao máximo. Preços domésticos da água sobem, "chafarizes municipais" param indefenidamente, temporizadores de água são colocados nos chuveiros das praias e proibe-se a lavagem e regadio de carros e jardins. Até aqui a contenção era feita, só e exclusivamente, quando era estritamente necessária.
Não deixa, por isso, de ser cómico um país ser tão sábio em provérbios e ditados populares e, simultaneamente, não optar por "prevenir em vez de remediar". Continuam-se a permitir a abertura de complexos de Golf no Algarve a torto e a direito e continuam a criar lagoas artificiais e chafarizes para patos nas cidades cuja única utilidade é a manutenção de votos e interesses políticos, ao mesmo tempo que ainda há pessoas que, mesmo conscientemente, não optam por pequenas acções que salvam, como não deixar a água a correr ao lavar os dentes e a tomar apenas banhos de chuveiro.
O problema, meus caros, está nas pessoas. Nas pessoas que não respeitam o sentido de comunidade e o altruísmo. Nas pessoas que privilegiam o estético em detrimento da racionalidade. Nas pessoas que apenas agem quando o perigo aparece e é iminente, em vez de o fazerem diariamente para que este nunca venha a surgir. Nas pessoas que ainda não se consciencializaram de que, uma vez atingido o limite, não há volta a dar.
É este o nosso povo. São estas as nossas pessoas. São os nossos vizinhos, são os nossos familiares, são os nossos colegas de trabalho e de estudo, às vezes somos nós. Um apelo meu não dá em nada; mas uma acção comum no sentido da prevenção de uma catástrofe como a falta de água salva-nos a todos, enquanto que a passividade e o facilitismo só contribuem, paradoxalmente, para o nosso mal-estar. Sempre acreditei que só se dá pela falta das coisas quando elas desaparecem; e tenho pena que, a este ritmo, aprendamos todos da pior forma.