Friday, March 03, 2006

O Nuclear

Eu já queria falar há algum tempo sobre este tema, mas estava com a internet avariada. Vou fazer este post para ver se contribuo para que as pessoas olhem para a questão da energia nuclear com alguma racionalidade. Não pretendo dissertar acerca de todas as vantagens desta energia - para isso temos o blog Central Nuclear - mas apenas criticar uma visão que me desconcerta em relação a este tema.
A primeira questão é sem dúvida a segurança. Na minha opinião, nas últimas décadas, os ambientalistas conseguiram criar na opinião pública um medo obsessivo em relação à energia nuclear. Hoje, grande parte das pessoas assusta-se só de ouvir falar em algum conceito que contenha "nuclear" ou "radioactividade". Não percebem bem porquê, mas algo lhes diz que não são de fiar. Ora, os políticos e outros agentes a quem não convenha assustar o público, consequentemente, também tendem a ficar assustados. Criou-se assim, um verdadeiro tabu. A ideia da insegurança inerente à energia nuclear estabeleceu-se de tal forma que até há bem pouco tempo (antes de o preço do petróleo disparar) se achava que a energia nuclear não teria seguimento. Felizmente, recentemente, têm aparecido pessoas com coragem para contra-argumentar isto. Fazendo uma análise racional e despida de preconceitos, vemos que não tem havido acidentes graves ultimamente e que os que houve, especialmente Chernobyl, se deveram a má manutenção das centrais. Hoje temos à disposição tecnologias mais recentes que nos garantem melhor fiabilidade, mas, por outro lado, também não estamos num sector pioneiro; já há know-how e não andamos aqui como que a fazer experiências cientificas. Acrescente-se ainda a sempre necessária visão pragmática: a haver insegurança, já a sofremos em virtude das centrais espanholas próximas da fronteira.
A segunda questão, ligada à primeira, é a ambiental. Como são os ambientalistas que se insurgem contra o nuclear, tem-se a ideia de que a energia nuclear é altamente nociva para o ambiente. Não vou obviamente dizer que não traz custos ambientais, mas o que interessa aqui é compará-los com os que advêm das alternativas para a produção de energia: essencialmente petróleo, carvão e gás natural (as renováveis são de lembrar, mas actualmente a sua falta de rentabilidade não permite que sejam uma escolha plausível para produzir em massa). É bem sabido que as centrais energéticas de combustíveis fósseis (principalmente as de carvão, que dominam em Portugal) são incomparavelmente mais poluentes que as centrais nucleares, designadamente no que diz respeito aos gases que provocam o efeito de estufa. Este facto é de maior importância agora que tanto se fala do Protocolo de Quioto e das sanções que podemos sofrer por não estarmos a cumprir os objectivos.
A terceira questão é a económica. Existe em Portugal ainda a ideia de que uma central nuclear é um projecto megalómano, inadequado às dimensões e necessidades do nosso país e, portanto, não digno de ser levado a sério. Aqui vou deixar a minha veia de liberalismo falar por si. Diz ela que se há um conjunto de investidores credíveis interessados em construir uma central nuclear em Portugal, prescindindo de qualquer apoio estatal, presume-se que eles fizeram estudos também credíveis e chegaram à conclusão que Portugal tem capacidade para absorver a energia que irão produzir e, se não tiver, sempre se pode exportar para Espanha. Diz-se também por aí, com base em argumentos algo rocambolescos que agora não vou enumerar, que, na verdade, o preço da energia produzida numa central nuclear será mais alto que a energia produzida por outros meios. Eu respondo, mais uma vez com a meu lado liberal: e depois? As leis do mercado são claras: se o preço for superior ao que os compradores estão dispostos a pagar, o negócio não tem pernas para andar e ficamos na mesma. Se o projecto não for subsidiado pelo Estado, os portugueses nada perdem (até ganhariam com o efeito multiplicador do investimento). Mas como há o tal grupo de investidores credíveis e com provas dadas no sector energético, custa-me a crer que o negócio não possa ter sucesso.
Por último, temos a tão desejada e necessária diversificação das fontes de energia. Não vou deixar falar o liberalismo, porque se trata de uma questão de planeamento da economia pelo Estado. Este é um tempo em que todos temos consciência de que a nossa dependência em relação aos combustíveis fósseis é insustentável a longo prazo, por vários factores, desde a instabilidade no Médio Oriente até ao previsível esgotamento destes recursos, passando pelo desequilíbrio da nossa balança comercial. Num tempo destes, não aceito que se desperdice uma oportunidade destas apenas por causa de um medo irracional, de um tabu. Os investidores não se podem dar ao luxo de esperar pacientemente por uma resposta do Estado, que o próprio governo diz que não vai dar nesta legislatura.
Penso que a nossa tarefa é mostrar aos políticos que não temos medo da energia nuclear, para que eles não se inibam de tomar as decisões certas.

5 Comments:

Blogger Luis Oliveira said...

E quem fala assim, não é gago...

Independentemente do valor que atribuímos a cada uma dessas visões, penso que é claramente notória a oportunidade de investimento que nos foi proposta.

Esperemos um parecer favorável do Governo nos próximos tempos, relativamente a esta matéria.

March 03, 2006 7:10 PM  
Blogger Luís Araújo said...

Não estou muito optimista quanto a isso. Depende da forma como a política nacional evoluir no próximo ano. Se correr bem para o PS, é possível que eles até aproveitem isso para mostrar a economia a andar. Se correr mal, não vão querer correr o risco.

March 03, 2006 7:21 PM  
Blogger Joao A. Correia said...

Que diabo... quem te ouvir falar até parece que o liberalismo é um homenzinho que se encontra ao teu ombro direito em que tu umas vezes lhe dás ouvidos e outras não.

Quanto ao "nuclear", tenho a mencionar um factor que terá passado algo despercebido á tua análise. Onde sería o local destinado para receber o dito "nuclear"? Sendo que nenhuma terrinha vai ser propriamente hospitaleira para tão benévolo projecto. Ninguém quererá ter vista para uma central nuclear; eu não quero. O que nos leva ainda para outro aborrecido problema... Que fazer aos resíduos nucleares? Sendo que já se descobriu que depositá-los no mar não é grande ideia.

March 05, 2006 4:56 PM  
Blogger Luís Araújo said...

Quanto ao homenzinho do liberalismo, não sei se ele de apresenta na forma humana (ainda que diminuta) nem se se encontra ao meu ombro direito, mas é verdade quando dizes que umas vezes o ouço e outras não. A questão é escolher quando o ouvir.

Quanto à localização, não há-de ser problema para investidores empenhados em andar como o projecto para a frente. Não faltam lugares pouco habitados. (cá está o tal homenzinho a dizer das suas)
Quanto aos resíduos, todos sabemos que são um problema difícil de resolver, mas também sabemos que eles não são produzidos em quantidades muito grandes e também haverá outro sítio pouco povoado onde os guardar, com a vigilância e condições adequadas, como convém.

March 05, 2006 5:42 PM  
Anonymous Anonymous said...

Eu não tenho medo da energia nuclear...tenho dito :P!

Cumprimentos

March 05, 2006 7:48 PM  

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